radicaos
memórias em quatro acordes

Escola de Escândalo

terça-feira, 18 de setembro de 2007

Uma das grandes bandas do rock brasileiro na década de 80 jamais alcançou o sucesso merecido, numa daquelas grandes injustiças da história, ninguém sabe se por ironia ou por uma afronta do destino. A Escola de Escândalo, formada em 1983, é uma das grandes referências brasilienses no cenário do rock brasileiro, embora jamais tenha alcançado a projeção que suas bandas-irmãs tiveram - Legião Urbana, Capital Inicial e Plebe Rude.

O grupo, cuja "formação clássica" era Bernardo Müller (voz), Geraldo "Geruza" Ribeiro (baixo), Luiz "Fejão" Eduardo (guitarra) e Eduardo "Balé" Raggi (bateria), foi um dos pioneiros na cena oitentista, fazendo um crossover maravilhoso entre o heavy metal e o punk - se é que isso existe. A banda nunca gostou de rótulos e se destacava pela brilhante cozinha de Geruza e Balé, a guitarra fenomenal de Fejão e a elegância da voz de Bernardo, que também era o responsável pelas letras da banda, outro ponto forte da Escola.

Passaram pela banda outros músicos locais, como Marielle Loyola, que dividia os vocais com Bernardo e, posteriormente, integrou outras duas importantes bandas brasilienses - Arte no Escuro e Volkana. Outros dois bateristas também fizeram parte da Escola, antes de Balé assumir as baquetas: Alessandro e Manuel Antônio Fragoso, o Totoni, que hoje trabalha como ator no Rio de Janeiro.

Antes de formarem o grupo, Bernardo e Geruza integravam, ao lado de Alessandro (bateria) e Jeová Stemller (guitarra) o grupo XXX, que liderou o movimento punk brasiliense ao lado da Plebe Rude no início dos anos 80 e realizou - junto com Legião Urbana, Capital Inicial, Banda 69 e a própria Plebe - a série de shows antológicos na Temporada do Teatro da ABO, em abril de 1983.

Da banda XXX, que tinha o som mais pesado entre os seus grupos contemporâneos e que mais se aproximava ao punk feito em São Paulo e no Rio, a Escola de Escândalo herdou grande parte do seu repertório inicial, como Caneta Esferográfica e Menino Prodígio. A antiga banda de Bernardo e Geruza resolveu encerrar suas atividades quando o guitarrista Jeová saiu, devido à transferência do pai diplomata, que deixou o Brasil para assumir o posto em outro país. Antes disso, o grupo conseguiu participar de um programa na televisão local, chamado Brasília Urgente.

Bernardo ainda atuou no lendário filme Ascensão e Queda de Quatro Rudes Plebeus, dirigido por Gutje Woorthman, baterista da Plebe Rude, e que ganhou o prêmio de um Festival de Cinema Super 8 de Brasília. Neste média metragem de aproximadamente 40 minutos, o jovem Bernardo, irmão de André X, da Plebe, protagonizava o vilão que roubava os plebeus no final do filme, que tinha a narração de Renato Russo. O líder da Legião Urbana também trabalhou como "ator" fazendo o papel de empresário inescrupuloso da Plebe.

Foi durante as apresentações no Teatro da ABO que Bernardo e Geruza conheceram Fejão, um guitarrista muito conceituado em Brasília e que tocava na banda Nirvana, liderada por Tadeu, futuro vocalista do grupo Beta Pictoris. Juntos, os três - mais o baterista Alessandro - começaram a ensaiar, trabalhando numa alquimia que refletia os gostos musicais de cada, algo que parecia impossível de ser tentado. As influências eram díspares: Van Halen, Led Zeppelin, Metallica, Echo and The Bunnymen, The Beat, Police, Talking Heads e Xtc, além de bandas de ska.

Naquele mesmo ano, o grupo saiu de Brasília para fazer suas primeiras apresentações no Rio de Janeiro, que há pouco tempo já tinha descoberto o rock brasiliense, pelas mãos de Herbert Vianna e Os Paralamas do Sucesso. A Escola fez o circuito das danceterias e casas de rock - Circo Voador, Noites Cariocas, Parque Lage, Mamão com Açúcar. Ali, trataram logo de encaminhar demos para as rádios Fluminense e Estácio, mostrando Luzes, que depois veio a constar do disco Rumores, lançado pelo Sebo do Disco em 1985. A música passou a liderar a parada de sucessos da maldita Flu durante um bom tempo.

Logo depois, o grupo entrou no pau-de-sebo Rumores, uma produção independente lançado pelo Sebo do Disco, ao lado das bandas Finis Africae, Detrito Federal e Elite Sofisticada. As duas músicas apresentadas neste disco da Escola eram Complexos e Luzes, que tiveram boa execução em Brasília e em algumas rádios do Rio. O disco foi gravado no estúdio Bemol, em Belo Horizonte, e hoje é peça de colecionador. A vocalista Mariele deixa o grupo em 1986. O sucesso Luzes foi relembrado pela Plebe Rude e consta do disco ao vivo lançado pela banda em 2000.

O namoro com uma gravadora não demorou e pelo menos duas ofereceram assinatura de contrato e a gravação de um disco. A banda, prontamente, recusou. Os quatro optaram por aguardar um momento mais oportuno para gravar seu disco.

Os amigos da Plebe e da Legião, juntamente com Herbert Vianna, pressionam a EMI-Odeon para um contrato com a Escola. A gravadora se dispõe a colocar os quatro no Estúdio 1 e Philippe Seabra produz as gravações para o disco, que seria lançado no formato de Mini-LP, tal qual a Plebe e a paulistana Zero haviam feito. As cinco canções registradas você ouve aqui - no que é chamado o "disco perdido" do Escola. São as canções: Atrás das Palavras, Deuses e Demônios, O Grande Vazio, Pérolas Sem Valor e Só Mais Uma Canção. Infelizmente, o disco acabou não rolando.

Pouco tempo depois disso, a banda encerrou suas atividades, para desespero dos fãs e falta de percepção das gravadoras, que ajudaram a acabar com um dos mais dignos e inteligentes grupos de rock de todos os tempos. Bernardo Müller, que virou economista, é hoje professor da Universidade de Brasília. Geruza tornou-se produtor de estúdio, tendo trabalhado durante muitos anos no famoso Artimanha, de propriedade do guitarrista Toninho Maia. Balé fez as malas, partiu para os Estados Unidos, onde trabalhou em artes gráficas e voltou para Brasília, onde montou a banda Resistores.

Já o guitarrista Fejão abraçou novo trabalho, mais calcado no heavy metal - com elementos do pós-punk -, liderando a banda Dungeon, que chegou a lançar um disco pelo selo Rock It!. Morreu em 1995, em Brasília, sem ver a obra do Escola reconhecida no mercado fonográfico.

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